por Maria Clara

Para quem é fã de Literatura e está envolvido no mundo literário, certamente já ouviu falar nos booktubers. Para quem não sabe, os booktubers são pessoas que gravam vídeos para o YouTube fazendo análises de livros. Eles são muito importantes para nós, amantes da leitura, pois, além de nos permitir conhecer outras pessoas que curtem o mundo dos livros como nós, também somos introduzidos a novas leituras e vários outros universos e pontos de vista. E, muito mais do que isso, numa era tão digital como a nossa, é enriquecedor envolver os livros nisso e não os deixar de lado.
Fizemos então uma entrevista com a Tamy Ghannam, do canal LiteraTamy. Ela produz conteúdo independente sobre os livros em prol de espalhar e manter vivo os livros pelo nosso país. Confira só a nossa conversa com ela:
Em uma das postagens do Instagram, você publicou que saiu em defesa dos livros, por quê? O que mais te incomoda/inquieta quando você se encontra em uma situação de defesa do livro?
Infelizmente, nós brasileiros vivemos um tempo em que nossa cultura, de modo geral, enfrenta ameaças. A literatura, que já anda desvalorizada há tempos, precisa combater taxações, oligopólios no mercado livreiro, desprezo de autoridades que enxergam nossos livros como um mero “amontoado de folhas escritas”, estereótipos nocivos e o consequente desinteresse da população. Daí então que surge necessidade de vir em defesa dos livros, uma iniciativa que carrego sempre como estandarte. É uma bandeira incômoda, sobretudo porque comprova nosso retrocesso. Em pleno século XXI, não só faltam no Brasil políticas públicas aplicadas à formação de leitores, tais qual a construção e o abastecimento de bibliotecas, como abundam tentativas claramente elitistas de barrar o acesso do povo à educação, de dificultar a pesquisa científica baseada nos livros e a existência de pequenas editoras que se dispõem a publicar obras diversas na contramão do conservadorismo.
Defender o livro é preservar nossa capacidade de nos humanizar por meio da literatura, a possibilidade de provar a existência pelo olhar de outros, é garantir que possamos diversificar nosso repertório cultural e fortalecer nosso senso de coletividade, estimulado pelo afeto e pela escuta. Defender o livro é acima de tudo, e, como diria Antonio Candido, defender um direito humano.
Há uma distância grande entre as pessoas e a poesia, até mesmo para quem é da área da Letras, o contato maior sempre é com a prosa. Por diversas razões, sendo por causa da estrutura, a dificuldade de interpretação, e entre outros motivos. Como foi para você se aproximar da poesia? Como você criou esse contato? Têm costume de ler poesia? E se você concorda que há essa distância e o que você tem a dizer em relação a isso?
Aproximei-me da poesia ainda na escola, quando me encontrei no poema “Meus oito anos”, de Casimiro de Abreu. Foi um processo meio natural de me enxergar ali naquele eu lírico. Depois veio Drummond e a potência de seus versos que batucavam dentro de mim. Escolhi manter esse contato porque sentia, e ainda sinto que a poesia toca em pontos bem ocultos do meu ser, e não que a prosa não o faça, mas a poesia tem um jeito muito próprio de fazê-lo, moldando-se em formas que penetram recônditos inabitáveis, que às vezes se escondem de propósito, em outras porque nunca houve quem os procurasse. Parece-me haver mesmo essa distância do leitor em relação à poesia (embora existam aqueles que, ao contrário, preferem-na à prosa) e imagino que isso aconteça porque ela é essencialmente desafiadora. A poesia exige que entendamos uma linguagem conhecida, mas disposta de modo inusual. Mesmo poemas descontraídos, com estilos mais livres e até próximos da oralidade, carregam alguma partícula formal a desvendar e nem todos os leitores sentem essa vontade. O que nem chega a ser um problema de fato. Ainda assim, porque me encanto pelo gênero, gosto de publicar declamações no canal e alguns projetos poéticos com a intenção de, quem sabe, convencer aqueles sem convencimento de que a essência da poesia tem origem no humano que nos compõe.
Como você enxerga os primeiros contatos da leitura? Uma vez que, nossos primeiros contatos não são com os grandes clássicos ( pessoas que hoje em dia tem seus 20 anos, provavelmente, em sua grande maioria, começaram o hábito da leitura com Harry Potter, Crepúsculo). Como você vê a importância desse tipo de literatura?
Acredito que todo primeiro contato com a leitura é mágico e surpreendente. Sobretudo porque se estende de uma leitura das páginas a uma leitura do mundo. Uma transformação irreversível e poderosa, independente de qual tenha sido sua porta de entrada. Livros como os citados são fundamentais não só à formação do leitor, mas muitas vezes constituem as preferências de leitores durante toda a vida. O mais importante é que os livros iniciais nos levem aos próximos – e assim sucessivamente. Qualquer obra que tenha esse potencial, e que não fira a humanidade de ninguém, é louvável.
Quais são suas referências para leitura? Você se inspira em alguém para manter seu hábito de leitura?
Um dia espero ser uma leitora tão interessada (e interessante) quanto Umberto Eco e tão dedicada quanto Otto Maria Carpeaux.
Você consegue organizar as leituras com as outras tarefas diárias? Como é o seu cronograma de leitura?
É curioso porque essa pergunta surge muitas vezes e eu, honestamente, não tenho como respondê-la. Apesar de trabalhar com leituras, e por isso tomar a maior proporção do meu tempo diário dedicado a elas, não as organizo em cronogramas, metas e prazos. Simplesmente as assumo como parte de mim e não fico sem elas.
E, por fim, sabendo que nosso país não há o hábito e incentivo para a leitura, como você incentiva aqueles que são distantes do hábito de ler? Quais são as suas dicas para incentivar/convencer alguém a começar a ler?
Não consigo pensar em formação de novos leitores sem insistir na necessidade de investimento em ações coletivas e políticas públicas que incentivem essa formação. Mas de maneira mais particular, tenho pra mim que a paixão é uma grande aliada do convencimento. É por meio da minha paixão pela literatura que eu tento tocar o outro, movê-lo em direção aos livros, que tanto nos oferecem, em diversos níveis. Muita gente não lê por achar que ler é chato, maçante, tedioso, por experiências negativas com a leitura que talvez tenha sido imposta como uma obrigação. Eu gosto de reafirmar o contrário, que ler pode ser libertador e animado, tão divertido quanto viajar a um lugar desconhecido e belo ou conversar com alguém interessante por horas. Que vale a pena à entrega, sabe? Diferentes universos/ mundos são criados através das páginas de um livro. É realmente gratificante, animador e prazeroso poder compartilhar, mostrando as diferentes interpretações e inquietações a os leitores que estão ingressando e incentivar mais indivíduos a conhecer esses mundos/ universos. Mostrando que a leitura é transformadora.
Tamy Ghannam do canal LiteraTamy. Siga na redes sociais: @literatamy e acompanhe seu canal no YouTube: https://www.youtube.com/channel/UCnC2L-aIzVyR_gJSZwPgX6g
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